GEOPOLÍTICA LATINA EM AGOSTO DE 2014
Após o calote, os chineses podem aproveitar o momento para oferecer financiamento aos argentinos sob a condição de vender a eles mais produtos
A queda nas exportações brasileiras para a Argentina deve se acentuar ainda mais até o fim do ano em função do estado de calote que o país vive. Até julho, as vendas caíram 22,6% e, nas estimativas da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), esse porcentual pode chegar a 27%. Em contrapartida, teme-se que a competição com a China, que já não é fácil, se acirre.
Os chineses vinham aproveitando o momento de crise para ganhar espaço. No mês passado, durante a visita do presidente chinês, Xi Jinping, ao país, os chineses se comprometeram a investir US$ 7,5 bilhões em hidrelétricas e liberar a compra de US$ 11,5 bilhões em produtos chineses com pagamentos a serem feitos em yuan, a moeda chinesa.
Após o calote, o crédito deve ficar mais escasso, e os chineses podem aproveitar o momento para oferecer financiamento aos argentinos sob a condição de vender mais produtos ao país. "Eles têm reservas de trilhões de dólares e não teriam o menor problema para dar financiamento", diz o presidente da AEB, José Augusto de Castro.
O avanço chinês já prejudica setores como o de calçados. O Brasil, colega de Mercosul, já exportou US$ 200 milhões em calçados para a Argentina. Neste ano, porém, deve vender pouco mais de US$ 50 milhões. No primeiro semestre, as vendas caíram 39%. No entanto, as importações de outros países fora do bloco, em especial da China, cresceram 11,4% em receitas, chegando a US$ 79,5 milhões.
Restrição
A redução do comércio entre os dois países se deu, em boa parte, pelas dificuldades que o próprio governo argentino impôs. Uma série de formulários passaram a ser exigidos. Entre eles, a Declaração Juramentada Antecipada de Importação, que nem é prevista nas regulamentações da Organização Mundial do Comércio (OMC) e visa a garantir a política do "uno por uno" - para cada dólar importado, um deve ser exportado. No mês passado, novos documentos da Receita Federal foram acrescentados à lista de exigências, tornando o processo ainda mais moroso.
"As restrições impostas pelo governo argentino levaram muitas empresas a suspender os negócios, mas agora o problema também é macroeconômico: a demanda vai cair", diz o diretor de negociações internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo(Fiesp), Mario Marconini.
O presidente da Câmara de Comércio Argentino-Brasileira de São Paulo, Alberto Alzueta, diz que o fluxo financeiro para o país deve cair e, com isso, o governo argentino tende a eleger a importação de itens mais essenciais, como energia e insumos, deixando importações dos manufaturados de lado.
Para o Brasil, neste momento em que a economia patina, a perda de espaço no mercado argentino piora o cenário do lado de cá da fronteira. A Argentina é o terceiro parceiro comercial do País e 90% das vendas são de bens manufaturados, como automóveis, máquinas e equipamentos, calçados e vestuário. A queda na demanda afeta, portanto, diretamente a indústria, que não vive um bom momento. A produção industrial brasileira caiu 1,4% em junho em relação a maio. Foi o quarto mês seguido de retração e o pior resultado no ano, segundo o IBGE.
Automobilístico
Para se ter uma ideia da importância do mercado argentino, cerca de 15% de toda a produção nacional de automóveis é destinada ao país vizinho. "Vai sobrar mais carro nos pátios", diz um executivo do setor. "E é bom lembrar que já estamos dando férias coletivas porque a demanda interna também está fraca."
As exportações de automóveis caíram mais de 30% neste ano e a expectativa é de que caiam mais. Mas os executivos do setor lembram que este já era um cenário difícil antes do anúncio do calote na quarta-feira. Os preços dos automóveis vinham subindo na Argentina cerca de 35% e enfraquecendo a demanda interna.
Com o calote, a situação piora. A indústria de máquinas, por exemplo, sofria menos. As vendas para a Argentina caíram pouco, menos de 2%. A expectativa agora é que a queda chegue a 4% até o fim do ano, segundo o presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq), José Velloso Dias Cardoso. Isso fará com que a queda na produção brasileira, antes prevista para 13%, aumente para 15%.
EUA está à procura de método humano para executar criminosos
Pena de morte mal executada no Arizona reabriu discussão sobre método que não se enquadre em castigos cruéis e inusitados, que são inconstitucionais Washington - Mais uma pena de morte mal executada, desta vez no Arizona, reabriu a busca nos Estados Unidos por um método para matar criminosos que não contradiga a proibição constitucional dos castigos cruéis e inusitados.
O caso mais recente foi o do detento Joseph Wood, que morreu na semana passada quase duas horas após receber uma injeção letal que tinha os mesmos compostos usados em outra polêmica execução em Ohio, há seis meses.
As testemunhas disseram que Wood, de 55 anos, continuou respirando de forma ofegante centenas de vezes, quando a execução deveria ter acabado em dez minutos.
Os Estados Unidos são um dos 58 países que ainda aplica a pena de morte enquanto outros 140 a aboliram, quase 80 deles após 1976, quando a Corte Suprema de Justiça americana a restabeleceu.
Entre 1890 e 2010 pelo menos 8.776 pessoas foram executadas nos Estados Unidos e 276 dessas execuções de uma ou outra forma foram feitas com erros que prolongaram a agonia do condenado, segundo lembrou esta semana Austin Sarat, um professor de Direito e Ciências Políticas no Colégio Amherst, de Massachusetts.
O país continua percorrendo um caminho tortuoso entre a demanda de vingança social contra os criminosos e a Oitava Emenda de sua Constituição segundo a qual 'não se infligirão penas cruéis e inusitadas'.
Paralela ao debate irresoluto sobre a pena capital em si transcorreu a polêmica sobre os métodos de execução, atingida recentemente por falhas e erros que resultaram em sofrimentos desnecessários para o executado.
'Os americanos estão fartos dessa barbárie', afirmou Dianne Rust-Tierney, a diretora-executiva da Coalizão Nacional para a Abolição da Pena de Morte. 'A pena capital é uma prática bárbara e barbarizante, ineficaz e que solapa o compromisso de igualdade sob a lei'.
Os defensores da pena de morte, em sua maioria, não são tão zelosos: para eles, a crueldade dos criminosos justifica que o Estado não gaste dinheiro em mantê-los atrás das grades, e qualquer que seja o método para matá-los não se equipara ao dor que causaram.
A popularidade da pena de morte foi diminuindo nos EUA, não tanto pelos aspectos cruéis de sua execução, mas por uma maior consciência social sobre as disparidades raciais nas sentenças, e a multiplicação de casos em que as provas genéticas demonstraram a inocência dos condenados.
Na última década diminuiu em dois terços o número de sentenças capitais e baixou em 50% o número de execuções. Segundo o Pew Center, o apoio da sociedade a esse castigo passou de 78% em 1996 para 55% hoje.
No livro 'Gruesome spectacles' ('Espetáculos horríveis', em tradução livre), o professor Sarat descreve com detalhe os casos de detentos decapitados quando deviam ser enforcados - por muitas décadas o enforcamento foi um espetáculo público - outros queimados na cadeira elétrica, a asfixia lenta na câmara de gás e o prolongamento da morte com injeções letais.
Segundo o acadêmico, entre 1890 e 2010 as execuções por todos os métodos, mal executadas, foram equivalentes a 3,15% dos 8.776 casos de pena capital. Entre 1980 e 2010, quando se generalizou o uso das injeções letais como castigo último, a taxa de falhas subiu para 8,53%.
O único método em que não foram registradas falhas de execução é o fuzilamento, enquanto a injeção letal registra uma taxa de falhas de 7,12%.
Sarat afirmou que os Estados Unidos passaram da forca ao fuzilamento, da cadeira elétrica à câmara de gás e finalmente à injeção letal buscando um método 'seguro, confiável, eficaz e humano'.
Três execuções este ano com injeções que combinam sedativos e narcóticos estenderam a agonia além do esperado e uma das razões é a falta de capacitação dos funcionários que fazem o procedimento.
A Associação Médica dos EUA proibiu a participação de médicos e profissionais de saúde nas execuções e estas ficam em mãos de pessoal não médico que deve aplicar as injeções intravenosas.
'Se há alguma dificuldade, ainda que menor, frequentemente está acima do nível de competência e de instrução dos executores', denuncia Sarat. EFE
Nenhum comentário:
Postar um comentário